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ação civil pública, ação popular, ambiente, culpa, dano, dano ambiental, dolo, ecossistema, lesão, meio ambiente, Ministério Público, precaução, reparação, responsabilidade
Introdução. Dano ambiental
O incidente com a barragem do Fundão, em Minas Gerais, em 5 de novembro de 2015, que arrasou o distrito de Bento Rodrigues, no Município de Mariana, e causou gravíssimo dano, fez crescer o interesse das pessoas em saber como ocorre a reparação de danos ambientais. Os danos atingiram o rio Doce e diversas áreas dos Estados de Minas Gerais e Espírito Santo e do mar, na foz do rio Doce. Pelos dados iniciais, o rompimento da barragem parece ser de responsabilidade da empresa Samarco Mineração S.A., a qual é controlada pelas empresas BHP Billiton Brasil Ltda. e Vale S.A.
Dano ambiental é qualquer afetação negativa ao meio ambiente, causada por ação humana, seja culposa ou dolosa. De forma muito sintética, ação culposa é aquela decorrente de negligência, imprudência ou imperícia; ação dolosa é a derivada de intenção ou de risco que o indivíduo conseguiu imaginar ou que assumiu.
Princípio da precaução
Um dos princípios fundamentais do Direito Ambiental é o princípio da precaução. Ele orienta a que qualquer ação com potencial de causar dano ambiental seja cercada de todas as cautelas para evitá-lo. Isso ocorre porque grande parte dos danos ambientais é irrecuperável, uma vez que não existe como reverter a morte de seres vivos e recuperar inteiramente danos causados a ecossistemas.
Infelizmente, nem sempre as pessoas respeitam o ambiente, nem sempre os órgãos administrativos atuam com a eficiência necessária para evitar esses danos, nem sempre órgãos como o Ministério Público cumprem integralmente seus deveres para impedir esses danos e responsabilizar os autores, nem sempre órgãos como a polícia apuram os fatos de forma satisfatória e rápida, nem sempre o Poder Judiciário aplica as leis ambientais com o cuidado necessário.
A combinação dessas deficiências é uma das causas dos frequentes incidentes ambientais. A humanidade, de forma tola, não se dá conta dos riscos que acarreta à própria sobrevivência com seus atos e age como se tivesse direito de exterminar fauna, flora e ecossistemas e de afetar as gerações futuras.
Responsabilidade
Quando alguém, seja pessoa física ou jurídica, causa dano a outra pessoa ou pratica ato contrário ao Direito (ato ilícito), faz surgir responsabilidade para si. Responsabilidade é a consequência jurídica de um ato.
Existem diferentes formas de responsabilidade no Direito. Ato contrário a norma penal gera responsabilidade penal; se o ato ilícito atingir o patrimônio de alguém, surgirá responsabilidade patrimonial (uma forma de responsabilidade civil); se o ato ferir norma administrativa, haverá responsabilidade administrativa, e assim por diante.
Às vezes, um mesmo ato gera mais de uma forma de responsabilidade. Se um servidor público cometer crime no exercício de sua função e causar dano patrimonial à vítima, esse mesmo ato gerará responsabilidade penal (pelo crime), administrativa (por agir ilegalmente na função) e civil (pela lesão ao patrimônio da vítima).
Nesses casos, cada forma de responsabilidade poderá ser apurada em um processo autônomo. É o que se chama de esferas de responsabilidade. No exemplo acima, poderá haver um processo criminal, um processo administrativo e um processo de natureza civil. Essas esferas de responsabilidade são relativamente independentes entre si, de forma que cada um desses processos, a depender das circunstâncias, poderá ter resultado diferente.
Responsabilidade por dano ambiental
Lesões contra o ambiente geram responsabilidade ambiental. Também podem acarretar responsabilidade civil, penal e de outras espécies.
A responsabilidade por dano ambiental tem vários fundamentos no Direito. A Constituição expressamente atribui à União, aos Estados e aos Municípios o dever de proteger o ambiente e legislar sobre ele (artigos 23, inciso VI; 24, inciso VIII, e 225, § 1.º). [O símbolo “§” lê-se como “parágrafo”.] Em se tratando de atividade econômica, é dever de todos a defesa do ambiente (artigo 170, inciso VI). No caso da propriedade rural, é obrigatório que cumpra sua função social, de acordo com o artigo 186, inciso II.
Além dessas várias normas da Constituição, esta ainda prevê, no artigo 225, § 3.º, que toda conduta lesiva ao ambiente sujeitará o infrator, seja ele pessoa física ou jurídica, a sanções (consequências) penais e administrativas e à obrigação de reparar o dano, independentemente de ter agido com dolo ou culpa.
Essas normas da Constituição são regulamentadas, entre outras, pela Lei dos Crimes Ambientais, a Lei 9.605, de 12 de fevereiro de 1998. O artigo 3.º dessa lei atribui responsabilidade à pessoa jurídica, quando o ato lesivo ao ambiente for praticado por qualquer pessoa no interesse dela.
Reparação do dano
Reparação é o dever de recompor da forma mais completa possível os prejuízos causados por um dano qualquer. O Código Civil (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002) estabelece como regra que toda pessoa que cause dano deve repará-lo (artigo 927). Dever de reparação também existe quando alguém causa dano ambiental.
Essa reparação deve ser integral, isto é, deve abranger todos os prejuízos de todas as pessoas lesadas pelo ato, incluindo danos ambientais (para recuperação da natureza da forma mais completa), danos materiais (aqueles que atingem o patrimônio) e o dano moral (o sofrimento causado pelos atos lesivos). Isso corresponde ao princípio da reparação integral.
De acordo com a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981), aquele que causar poluição (qualquer afetação negativa do ambiente) fica obrigado a repará-lo, independentemente de ter agido com culpa (artigo 14, § 1.º). É o chamado “princípio do poluidor pagador”. Responsabilidade mesmo sem culpa é o que se denomina em Direito de responsabilidade objetiva.
A prioridade da lei é a restituição do ambiente ao estado anterior à lesão ambiental (o que se chama de “statu quo ante”, na expressão em latim), conforme o artigo 4.º, inciso VII, da Lei 6.938/1981.
Ação popular
Ação popular é uma espécie de ação que qualquer cidadão brasileiro pode promover, por meio de advogado, diante de ato que cause prejuízo ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Essa autorização está expressa no artigo 5.º, inciso LXXIII, da Constituição da República.
Essa modalidade de ação tem seu processo regulamentado pela Lei 4.717, de 29 de junho de 1965. Apesar de antiga, essa lei ainda se encontra em vigor. Portanto, a partir de 5 de outubro de 1988, quando a atual Constituição foi promulgada e entrou em vigor, passou a caber ação popular por dano ambiental.
Ação civil pública
Além da ação popular, no caso de dano ambiental também é possível o ajuizamento de ação civil pública (ACP). Quando se trata de lesão ao ambiente, as duas ações podem ter o mesmo objetivo e os mesmos efeitos.
Uma das diferenças essenciais entre ambas é que o autor da ação popular é qualquer cidadão, enquanto o da ACP pode ser o Ministério Público (é o que ocorre na maioria das vezes), a Defensoria Pública, a União, Estados, Municípios e algumas outras pessoas jurídicas.
A ação civil pública é regulamentada pela Lei 7.347, de 24 de julho de 1985.
Ela pode ser usada para definir a responsabilidade de uma empresa que cause dano ambiental e dano ao patrimônio de pessoas afetadas por ele. Se o Ministério Público propuser ACP para essa finalidade e o Poder Judiciário julgar procedente o pedido, bastará que, na fase posterior, chamada processo de execução, cada pessoa atingida demonstre o prejuízo individual que sofreu. A ação civil pública também pode pedir que o Judiciário fixe valor mínimo de indenização para cada pessoa afetada.
Proteger o ambiente é uma das missões do Ministério Público, definidas na Constituição (artigo 129, inciso III), assim como proteger interesses coletivos.
Ação individual
A lei não impede que uma pessoa atingida por dano ambiental processe o responsável, individualmente. Em qualquer caso, será preciso contratar advogado(a) de confiança ou dirigir-se à Defensoria Pública (caso ela aceite a causa), para que um ou outro avalie os fatos e decida a melhor forma de buscar a reparação integral dos danos. Um dos caminhos processuais possíveis, nesses casos, é o da ação de indenização.