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ação penal, Câmara dos Deputados, crime comum, crime de responsabilidade, denúncia, impeachment, impedimento, Improbidade administrativa, presidente da República, Procurador-Geral da República, recebimento da denúncia, responsabilidade, Senado Federal, Supremo Tribunal Federal
Conceito de responsabilidade
Na linguagem jurídica, o termo responsabilidade tem um significado específico, que se diferencia da noção coloquial de alguém que corresponde às suas obrigações, embora tenha relação com essa ideia.
Responsabilidade, em Direito, é a capacidade de alguém de sofrer as consequências de um ato ilícito, ou seja, de um ato que fira alguma norma jurídica. Quando isso ocorre, quem descumpriu a norma jurídica sofre uma sanção, termo que indica a consequência do descumprimento da norma (pode ser uma pena criminal, o dever de indenizar, uma multa tributária etc.). A sanção deve ser prevista na própria norma descumprida ou em outra.
Espécies de responsabilidade
O Direito trata de diversas espécies de responsabilidade, a depender da norma que o sujeito descumpra. Algumas das principais formas de responsabilidade são as seguintes:
a) responsabilidade civil: surge quando alguém causa dano (material ou moral) a outra pessoa; disso decorre o dever de indenizar quem haja sofrido o dano;
b) responsabilidade penal: nasce quando alguém fere uma norma penal e pratica um crime ou contravenção penal; disso decorre o direito do estado de punir o agente da infração penal com alguma pena prevista na legislação criminal, conforme o caso (pena privativa de liberdade, pena restritiva de direitos etc.); na quase totalidade dos casos, cabe ao Ministério Público propor a ação penal para que o Judiciário julgue o fato e aplique a pena;
c) responsabilidade política: surge para algumas espécies de agentes públicos, como o presidente da República, os ministros do Supremo Tribunal Federal e outros, quando pratiquem crime de responsabilidade (descritos na Lei 1.079, de 10 de abril de 1950);
d) responsabilidade por improbidade administrativa: nasce quando alguém pratica algum dos atos descritos na Lei da Improbidade Administrativa (Lei 8.429, de 2 de junho de 1992), que tem regime jurídico (tratamento legal) próprio e que pode gerar punições específicas;
e) responsabilidade tributária: surge quando alguém descumpre uma norma tributária, seja a que manda pagar um tributo, seja a que manda cumprir certas obrigações, como apresentar declaração de atividades à administração tributária, por exemplo.
Responsabilidade civil do presidente da República
Se o presidente da República (ou qualquer outro agente público), por ação ou omissão, cometer dano contra alguém, fica obrigado a pagar a correspondente indenização (art. 927 do Código Civil). A pessoa que sofreu o dano tem a possibilidade de processar o ente público de cujos quadros o causador do dano faça parte: no caso do presidente da República, deve processar a União, que é a pessoa jurídica da qual a presidência da República é órgão.
O dever da União de indenizar dano causado pelo presidente da República (e por qualquer agente público de sua estrutura) está no artigo 37, § 6.º, da Constituição da República. [Obs.: O símbolo “§” lê-se como “parágrafo”.]
Caso a União seja processada e condenada a indenizar alguém por ato do presidente da República (ou de qualquer agente público federal), poderá processar o agente público causador do dano, se ela tiver agido com dolo ou culpa, por meio de uma ação judicial denominada ação regressiva.
Responsabilidade do presidente da República por ato improbidade administrativa
O presidente da República não pode ser réu em ação por improbidade administrativa. O Supremo Tribunal Federal decidiu que o presidente da República é o único agente público não sujeito diretamente às regras da Lei da Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992), porque a Constituição o trata de forma específica, no artigo 85, inciso V, ao considerar os atos de improbidade por ele praticados como crime de responsabilidade, sujeitos ao regime jurídico (tratamento) da Lei 1.079/1950 (STF, Plenário, agravo regimental na petição 3.240/DF).
Portanto, se cometer ato de improbidade administrativa, o presidente da República só poderá ser responsabilizado pelo Congresso Nacional, se for o caso, em julgamento de crime de responsabilidade.
Responsabilidade política do presidente da República
A responsabilização política do presidente da República ocorre quando ele comete algum dos crimes de responsabilidade indicados no artigo 85 da Constituição da República e na Lei 1.079/1950 (Lei dos Crimes de Responsabilidade). O cometimento de crime de responsabilidade e seu processo podem levar a seu impedimento (também conhecido como impeachment).
Os crimes de responsabilidade não são idênticos aos crimes descritos nas leis criminais comuns (as quais o presidente da República também está obrigado a cumprir). Os crimes de responsabilidade são descritos de forma mais genérica na Constituição e na Lei 1.079/1950 e seu julgamento é jurídico mas também político, pois cabe ao Congresso Nacional. Não é essencialmente técnico, como o julgamento que o Poder Judiciário faz dos crimes comuns, embora deva seguir os trâmites previstos na Constituição da República e na Lei 1.079/1950, principalmente.
Qualquer pessoa pode oferecer denúncia contra o presidente da República por crime de responsabilidade. Ela deve ser dirigida ao presidente da Câmara dos Deputados (art. 14 da Lei 1.079/1950). Cabe a este realizar o exame inicial da denúncia e arquivá-la, se a considerar claramente improcedente. Caso entenda que a denúncia tem provável consistência, irá despachá-la a uma comissão especial, com integrantes dos partidos políticos de forma proporcional à representação deles na Câmara. Os arts. 17 e seguintes da Lei 1.079/1950 esclarecem o procedimento a ser seguido na Câmara dos Deputados.
Ao final dessa fase, se o Plenário da Câmara autorizar a abertura de processo, por dois terços de seus membros, em votação aberta (Constituição, art. 51, inciso I), enviará o processo ao Senado Federal, ao qual cabe julgar o mérito da acusação. O Senado também constituirá comissão para reunir provas e analisar a acusação, de forma rápida, em caráter preliminar. Após isso, cabe ao Plenário do Senado, por maioria simples (Constituição, art. 47), decidir sobre a admissibilidade da acusação. Se o Plenário do Senado, nesse momento, resolver instaurar o processo, o presidente da República será suspenso de suas funções (Constituição, art. 86, § 1.º, inciso II).
Depois dessa votação do Senado Federal, a presidência do processo passa ao presidente do Supremo Tribunal Federal, embora ele continue a tramitar no Senado. A acusação e a defesa poderão produzir argumentos e provas. Caso o processo no Senado não termine em até 180 dias, cessará o afastamento do cargo, mas o processo deverá prosseguir (Constituição, art. 86, § 2.º).
Ao final, a acusação será levada a julgamento do Plenário do Senado Federal, que poderá absolver ou condenar o presidente da República e inabilitá-lo para exercer qualquer função pública por oito anos (art. 33 da Lei 1.079/1950). Se o condenar, ele será destituído do cargo de presidente, e poderá ainda responder pelo ato na esfera criminal, se tiver praticado crime comum.
Responsabilidade criminal do presidente da República
O presidente da República, como qualquer pessoa, está obrigado a cumprir as leis penais, as quais definem os chamados crimes comuns. As diferenças mais importantes de sua responsabilidade são as seguintes:
a) se, durante o mandato, praticar crime estranho às funções da presidência, somente poderá responder a ação penal após o fim do mandato (Constituição, art. 86, § 4.º); neste caso, encerrado o mandato, o então ex-presidente será julgado na primeira instância;
b) se, durante o mandato, praticar crime no exercício das funções, cabe ao procurador-geral da República investigá-lo, sob supervisão do Supremo Tribunal Federal, e cabe ao STF julgá-lo (Constituição, art. 102, inciso I, alínea b);
c) se o procurador-geral da República oferecer denúncia (acusação formal) contra o presidente da República perante o STF, por crime comum, haverá uma fase anterior à instauração da ação penal, nos termos dos arts. 4.º e 5.º da Lei 8.038, de 28 de maio de 1990); encerrada essa fase, caberá ao Plenário do STF decidir sobre o recebimento da denúncia, isto é, sobre a viabilidade da acusação e sobre a existência de provas iniciais suficientes da ocorrência do crime e de sua autoria;
d) antes do recebimento da denúncia pelo STF, é necessário autorização do Plenário da Câmara dos Deputados, por maioria de dois terços de votos (342 dos 513 deputados), devido à regra do art. 86, caput, da Constituição; [“Caput” significa “cabeça” em latim e indica a parte principal de um artigo.]
e) caso o STF receba a denúncia do procurador-geral da República contra o presidente da República, este será afastado do exercício das funções (Constituição, art. 86, inc. I); o processo prosseguirá, com direito a ampla defesa por parte do acusado, até o julgamento do mérito da ação penal;
f) o presidente da República somente pode ser preso, no caso de crime comum, após decisão condenatória (art. 86, § 3.º, da Constituição).
Uma aula magna, vou guardá-la em meu arquivo pessoal, quem sabe um dia meus tetra netos consigam fazer valer esse lindo texto. Porem, que de beleza e valor real só existe no papel absolutamente fora de contexto e da realidade nacional. No mais o que vale é a realidade política aplicada pelo mestre Dr. Honoris Causa Sr, Lula da Silva, ” Poder judiciario não vale nada, o que vale são as relações pessoais”. Incontestavel realidade.
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Obrigado pela parte do elogio. Meu texto limita-se a explicar os mecanismos existentes na Constituição e nas leis brasileiras, para atender à dúvida de muitas pessoas. Essa é a finalidade do blog.
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”Poder Judiciário não vale nada, o que vale são as relações pessoais”.
Depois que o “Honoris Causa” foi solto da prisão [o que é diferente de ser inocentado] após o STF retirar a prisão após 2ª instância e mais adiante, teve seus processos reiniciados, tendo boa parte dos seus crimes prescritos, e considerando ainda que ele mesmo indicou ou mesmo participou da indicação de 7 ministros do STF, a minha dúvida é a seguinte: ele ainda menospreza todo o Judiciário ou realmente fez confirmar a sua tese? 🤔
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Qual sua intenção em fazer essas postagens? Porque não fez na era PT?
Kacia Alves
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Prezada Kácia, eu não estou defendendo nada em relação ao atual presidente da República. Meu texto limita-se a explicar os mecanismos existentes na Constituição e nas leis brasileiras, para atender à dúvida de muitas pessoas. Essa é a finalidade do blog
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Excelente texto. Desde a linguagem clara e objetiva, até os detalhes procedimentais de natureza técnica, que exigem a devida referência constitucional e legal, o autor se fez entender com sucesso. Parabéns.
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Apesar dos esforços do MPF para concretizar em lei a lista tríplice para a escolha do(a) PGR por parte do(a) PR, diminuindo a interferência política sobre a própria instituição, jamais um(a) PGR denunciará criminalmente aquele(a) que lhe indicou…
Augusto Aras, que sequer tinha participado do pleito eleitoral interno do MPF em 2019, foi escolhido a dedo pelo Bozzonaro justamente para lhe proteger, enquanto uma possível vaga no STF era usada como barganha jurídica.
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